terça-feira, 1 de junho de 2010

cartA parA AlinE






Aline, boa tarde.

Acabo de completar 27 anos, e durante algum tempo acreditei que poderia ser tudo o que quisesse. Não sei bem ao certo como as coisas passaram a não dar certo, mas me dei conta de que a vida não caminhava do jeito que eu queria após sobreviver a um acidente vascular cerebral – a minha sorte, segundo o médico, foi que o sangue, que poderia ter surgido de uma artéria estourada no cérebro, vazou pela minha boca.

Desde então, resolvi realizar coisas que acredito e você, depois de um certo passa e repassa, foi a primeira pessoa que encontrei. Você já teve a sensação estranha de que a criança que foi um dia poderia se decepcionar com o que é, agora? Pois é, esse era eu, numa tentativa de recuperar o tempo perdido, quando entrei em contato.

Venho de uma família muito pobre, embora meu pai tenha sido primo do ex-presidente Castelo Branco. Sou o décimo filho dele, e o único que decidiu ser jornalista – também influenciado pela profissão do Clark Kent. O problema é que a realidade bateu desde sempre à minha porta.

Para concluir a faculdade de jornalismo, antes de me dividir em vários estágios, trabalhei como assistente de biblioteca, pela manhã, e à tarde, como faxineiro. Na época, ou eu pagava a universidade, ou fazia o curso de inglês, que acabei nunca fazendo – embora já tenha coberto eventos internacionais em outros países, sem saber a língua, e tenha entrevistado, aos 21 anos, Sidney Sheldon. Depois, ou me casava, ou me aperfeiçoava. Optei pela primeira opção, e não me arrependo.

Nunca tive a ajuda financeira de meus pais, não porque eles não quisessem, mas porque não tinham como e, dentro desta realidade, dividindo meu tempo como animador de festas, tatuador de henna na praia, vendedor de livros usados, monitor de um parque cultural, concluí meu curso universitário. Nem ninguém por mim, e talvez por isso, também não tive nenhuma grande oportunidade. A impressão que tenho é a de que, sempre que sou lembrado, é para oportunidades que não são muito boas. Comecei assim, e até hoje não tive grandes feitos.

Procurei você para realizar um sonho, bobo, mas nem por isso menos sonho. Fazer sucesso em um site que tivesse alguma visibilidade para que eu pudesse me projetar, aos poucos, como escritor, era o meu objetivo. O que eu havia pedido era, para você, algo muito simples de ser realizado. Só que, por algum motivo, você aparentemente não simpatizou comigo. Eu não a conheço, não sei se é uma pessoa fácil ou difícil de lidar, ou se está habituada a conhecer pessoas que se aproximam de você por interesse e por isso impõe algum distanciamento, mas confesso que não gostei da maneira como me tratou desde o primeiro contato.

Se alguém insiste, Aline, está atrás de uma resposta. Cada um traz, em seu mundo, todos os contextos possíveis e imaginários. No meu caso, deve ter sido a insistência, e as interrogações: “quem é ele?” ou “quem ele pensa que é para tentar algo aqui?”. Lamento profundamente tudo isso, o tempo que perdi insistindo com você e, sobretudo, a falta de respostas – no mínimo, Aline, eu sou um leitor. Merecia alguma consideração, nem que fosse aquela resposta padrão: “avaliamos e, no momento, você não se enquadra no perfil de nossos colaboradores”. Numa boa! Mesmo! Agora, pedir dados de um site, e depois sequer responder é, no mínimo, falta de consideração.

No final das contas, você não me colocou para falar de livros no portal, mas também não preencheu a lacuna. E isso é tudo muito triste, pois acredito que desempenharia bem o papel. Só pedi uma oportunidade, nada mais. Posso não ter a cultura, ou o estudo, ou as viagens, que requer um profissional daí, mas experiência de vida eu tenho de sobra, sou um apaixonado pelo que faço, e do resto posso correr atrás. Sou honesto, leal, e se estivesse falando isso cara a cara para você, possivelmente não diria a metade. Diz a etiqueta, que quando você pede algo a alguém, você deve deixar a pessoa à vontade para dizer “não”. Acho que fiz tudo direitinho. Pelo menos, tentei.

Cuide-se bem, e muito.

Tomara que você seja mais receptiva quando alguém procurá-la da próxima vez.

Helder

Um comentário:

Hely disse...

Você escreve bem demais!
Beijão!