quinta-feira, 22 de julho de 2010

Exercício de literatura / sinopse de romance

A pergunta que seguia sem resposta ainda martelava em sua mente quando entrou, com Herédia, ao pequeno café. Naquele exato momento, o mesmo em que cumprimentou Solange e lhe pediu dois cafés pingados, lembrou-se do encontro entre Eduardo e Sophia no texto que lhe foi carinhosamente enviado à sua caixa de mensagens por Camila, talvez a mulher de sua vida, não fosse ela tão moderna.

Encontrou Camila uma vez na vida e, depois disso, trocaram correspondências – ela o entendia, e lhe confidenciou que vivia um relacionamento a três, com um homem e uma mulher. Diante disso, Camila ficou ainda mais interessante, mas se tornou ainda mais amiga e, por isso, trocaram os endereços virtuais dos blogs secretos, em que se confessavam. Em uma de suas mensagens, no entanto, ela narrou um encontro entre os pseudônimos, regados a “tapioquinhas” e conversas doces. Mas agora ele estava diante de Herédia, e o que queria era perguntar coisas mais íntimas, como a última vez em que manipulou uma mulher.

Então, disse coisas corriqueiras e iniciou a conversa sobre a temperatura amena. O pai o intimidava e, de longe, embora permanecesse invisível aos olhos dos dois, e de muitos outros, Solange, em sua mania de imaginar a vida dos outros enquanto lambia um pirulito vermelho em formato de coração, acreditava em uma conversa mirabolante que, talvez, nem chegasse perto das reais intenções da prosa de Yago. Solange, transsexual de meia idade, já aposentada dos palcos e esquecida atrás de um balcão sem o gloss que passava diante dos espelhos do passado, agora sonhava em ser detetive.

“Quando você vai deixar de ser menino e se tornar um homem?”, questionou a esposa na noite anterior. E, embora diante do pai enquanto falava coisas que aconteceram em seu dia a dia, aquela questão detonou, nele, uma bomba silenciosa. “Ela está descobrindo”, pensou, e precisava contar a alguém. O fato é que sempre amou Mariana, e a oportunidade de que a moça, muito branca e de traços suaves, fosse dele surgiu tarde demais. Quando ele já a havia perdido para o irmão gêmeo.

A proposta de Yarco, com um pé no altar, por mais absurda que pudesse aparentar, era a última chance. “Você vai no meu lugar, casa com ela, e eu fico livre. Assim, ninguém sofre”, disse, com o ar debochado de sempre, sendo que desta vez estava sério e, ao que tudo indicava, tão desesperado quanto ele. Não contaria ao pai do ódio velado entre os dois, tão bem disfarçado, mas precisava revelar o que havia acontecido.

Jamais diria, mais por ética do que por alguma consideração ao irmão, que Yarco havia se apaixonado por um rapaz exatamente um mês mais velho e alguns centímetros mais alto, e que não achava justo que, com a mesma imagem, o irmão fizesse coisas que pudessem denegri-lo como homem. Eles trocaram a vida aos finais de semana e quando chegavam em casa. A diferença é que, na vida profissional, continuavam com a mesma rotina.

Nenhum comentário: